Por Lucas Daher para rockontro.com
Stanley Kubrick tem provavelmente a filmografia mais diversa dentre os grandes diretores. Ele se aventurou por vários gêneros: de terror a comédia, passando por ficção científica, obteve sucesso em todos eles. Há, porém, um tema recorrente em seus filmes, ainda que abordado por diferentes ângulos: a guerra.
“Glória Feita de Sangue” (1957) se passa na Primeira Guerra Mundial e tem uma visão pacifista. Em “Dr. Fantástico” (1964), a Guerra Fria e a ameaça nuclear são material para uma das melhores comédias do cinema. Mas apenas em “Nascido para Matar”(ou “Full Metal Jacket”, no original), de 1987, Kubrick faz um filme de guerra propriamente dito.
Baseado no livro “The Short Timers” (1979), “Nascido para Matar” apresenta uma estrutura narrativa não convencional, sendo dividido em duas partes “independentes” e cenas desconexas, tendo nelas o próprio fim.
A primeira parte do filme se passa em Parris Island, um campo de treinamento de fuzileiros navais comandado por Hartman, interpretado brilhantemente por R. Lee Ermey, um sargento durão que maltrata os recrutas. Um deles, Leonard Lawrence (interpretado por Vincent D’Onofrio), é especialmente maltratado por Hartman e posteriormente passa a ser odiado por seus colegas.
A representação é dramática, com toques de comédia negra e diálogos memoráveis. O espectador é entretido e levado a refletir. O ritmo é fantástico, nem um pouco cansativo. A cena final com Hartman, Leonard – chamado de Private Gomer Pyle –, e Private Joker (o único amigo de Leonard) é especialmente intensa.
A segunda parte mostra Private Joker (interpretado por Matthew Modine) no Vietnã, em passagens que representam vários aspectos da vida dos soldados, como, por exemplo, a famosa cena em que uma prostituta tenta seduzi-lo dizendo “me love you long time.” Ela é mais arrastada e cansativa, sem a mesma fluidez da primeira parte, mas isso é proposital e acrescenta à caracterização da atmosfera do campo de batalha.
Uma personagem merecedora de destaque é Animal Mother, um soldado sarcástico e niilista, brutalizado pela guerra. Ele já não se importa com nada, mata sem remorso. Suas falas são muito marcadas por esses traços. Ao ver uma vala com vários mortos, ele diz “melhor vocês do que eu,” quando está sendo entrevistado, ele fala “o que eu acho do envolvimento dos E.U.A. na guerra? Acho que devemos ganhá-la.”
Embora muitas cenas possam ser compreendidas sozinhas, há uma sutil ligação entre elas e o filme como um todo apresenta um panorama assustador da guerra e dos seus efeitos psicológicos nos envolvidos, principalmente em Joker. Ele começa trabalhando como correspondente de guerra em uma revista americana e um colega percebe que ele não tem nenhuma experiência de guerra, pois não tem o “thousand yard stare” (um olhar ao longe, confuso, típico de combatentes traumatizados). Ao fim do filme, Joker mata uma mulher ferida para acabar com seu sofrimento e vemos então seu “thousand yard stare,” indicador de profunda mudança psicológica.
A notória importância que Kubrick dá às trilhas sonoras de seus filmes faz com que as imagens contundentes de “Nascido para Matar” sejam bem emolduradas por músicas do cancioneiro de pop e rock dos anos 1960.
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